Continuou a ser examinada nesta quarta-feira (5/11/2024) no Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano e Ambiental de Porto Alegre a proposta do Grupo Zaffari para ser construído no quarteirão formado pela av. Praia de Belas, Borges de Medeiros, Praça Itália e o Hotel Blue Tree Towers Millenium. Na área, situava-se a Fundação de Recursos Humanos e era também utilizada para instalação de circos e parques de diversões. Estão previstas atividades residenciais, comerciais e de serviço. A divulgação dos pareceres não foi concluída e o plano é votar na próxima semana, mesmo horário — quarta, dia 13/11, 18h.

As sessões do CMDUA são transmitidas ao vivo e armazenadas na conta da SMAMUS no YouTube.
Fernando Campos, conselheiro titular pelas Amigas da Terra Brasil, entende que o projeto traz insegurança jurídica. “Este Conselho não discute a Cidade — discute projetos de empresários. Este Conselho não garante o posicionamento dos representantes das Regiões e seus delegados. As leis são acúmulos construídos pela sociedade, se não mudaríamos tudo de quatro em quatro anos. O CAU – Conselho de Arquitetura e Urbanismo reafirma que algumas alterações não podem ser feitas sem consultar a comunidade. É uma falsa democracia. Não somos contra o projeto, mas contra a forma com que está sendo feito”.

É tal a altura do prédio principal que, para a emissão da licença de construção será exigida a liberação do Departamento de Controle do Espaço Aéreo da Força Aérea Brasileira por possíveis ingerências nos voos que usam o Aeroporto Salgado Filho.
Primeiro voto – A conselheira representante do Gabinete do Prefeito, designada relatora pelo presidente do colegiado, que é o titular da Secretaria do Meio Ambiente e Sustentabilidade, foi a primeira a divulgar em sessão anterior um parecer favorável ao projeto de 5 torres de edifícios ocupando toda uma quadra, de alturas variadas, de 61 a 130 metros de altura, extrapolando a altura máxima dos projetos abrangidos pelo Plano Diretor. Para projetos que preenchem determinadas condições a lei prevê a possibilidade do empreendimento ser catalogado de ‘especial’ e ter características diferentes, inclusive na altura.

Primeiro voto-vista — Para Jussara Kalil Pires, socióloga e conselheira titular representando a ABES – Associação Brasileira de Engenharia Sanintária e Ambiental / Seção RS, o EVU – Estudo de Viabilidade Urbanística do projeto do Zaffari não deve ser aprovado. Jussara indicou diversas deficiências nos estudos apresentados pela empresa e analisados pelo pessoal da Prefeitura Municipal. Indicou que o NORIE – Núcleo Orientado para a Inovação da Construção da Faculdade de Engenharia Civil e Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil — Construção e Infraestrutura — da UFRGS deva ser consultado para “dar mais segurança à sociedade” em relação à insolação e aos ventos provocados ou alterados pelos edifícios.
A indicada pela ABES, com longa experiência em colegiados, notou que “ao longo do processo, em diversas vezes as Secretarias integrantes da CAUGE manifestaram que as diretrizes iniciais não haviam sido seguidas, a exemplo da SMDE que destacou que o Parecer CAUGE 082/2019 apresentou como diretriz flexibilizar a altura para o máximo de 80m. A proposta inicial apresentada além de prever alturas ainda maiores não atendeu outras diretrizes.” CAUGE – Comissão de Análise Urbanística e Gerenciamento é o colegiado que reúne os representantes de organismos municipais para opinarem sobre os projetos especiais.
Entende que “parece inadequada a implantação de um conjunto de prédios das alturas solicitadas”. “Não há porque fazê-los. Tais alturas são convenientes e justificáveis apenas do ponto de vista do empreendedor. A cidade nada teria a ganhar com a flexibilização pretendida“. Concluiu afirmando que, conforme manifestado diversas vezes pela CPU – Coordenação de Planejamento Urbano “tal projeto deveria ser objeto de consulta pública a ser realizada antes do posicionamento do CMDUA”.
Destacou Jussara problemas em relação à paisagem urbana, elementos de insolação, iluminância e ventilação. Afirmou que a altura dos prédios interfere no visual que se tem dos morros da cidade. “Não foi avaliado o impacto sobre quem vem da Zona Sul pela Borges de Medeiros”. “Não há adequação ao entorno ou qualquer esforço de integração paisagística“, afirmou.
Observou Jussara que o Município solicitou inicialmente mais detalhamentos e estudos sobre a insolação, iluminância e ventilação. “Ainda assim, a proposta apresentada oferece solução que não atende totalmente os limites de conforto para a questão dos ventos”. “A análise da CPU aponta, inclusive, que, no espaço entre os prédios, a velocidade do vento tem potencial para tornar-se perigosa, inclusive lançando pessoas ao solo, em freqüência superior ao que a literatura indica como tolerável“. Após o processo voltar à Coordenação, foi aceito o risco de ocorrência de ventos fortes até duas vezes ao ano, considerando medidas de minimização dos ventos.
Em relação ao trânsito e ruas, Jussara ressalta que deve ser considerado o aumento do número de veículos: “Tem sido comum a implantação de grandes conjuntos habitacionais sem que se pense que os moradores recebem visitas, promovem pequenos eventos e outras ações que impactam sobre o uso das vias públicas adjacentes”. A região já tem problemas de vagas, afirmou. O parecer dos órgãos técnicos da Prefeitura Municipal deixam exigências não cumpridas pelo empreendedor para serem analisadas posteriormente à apreciação pelo CMDUA.

Afirma que “quanto à forma edificada, a CPU anexa um quadro comparativo entre os recuos exigidos pelo PDDUA e os propostos. Neste quadro, a título de exemplo, cito que para as torres A e B, que têm 100m, o PDDUA propõe o máximo de 52m e 25% de afastamento, ou 13m. Aplicando a mesma proporção para a altura proposta, tem-se que o recuo deveria ser de 25m. O projeto, porém, propõe 18% ou 18m. No caso da Torre C, a mais alta, a flexibilização é ainda maior. Enquanto o recuo deveria ser de 32,5m, o empreendedor solicita que seja de 18m.”
A conselheira considera que “Fica claro que os pressupostos de projeto e as soluções oferecidas para o trânsito de pedestres, veículos de passeio, carga e descarga e transportes coletivos não atenderam as recomendações técnicas”.
Sobre o aumento do consumo de água “fica a dúvida sobre a capacidade de serem atendidos todos os projetos implantados ou já aprovados — não existe manifestação expressa do DMAE sobre isto”. “Convém que o DMAE reavalie todos os aspectos considerando o planejamento numa perspectiva mais ampla“. Observa que há previsão de um novo projeto junto ao arroio Dilúvio e também outros junto à orla do Guaíba.
Lembra ainda Jussara, em relação à insolação e ao efeito de estresse por calor “considerando as barreiras à ventilação representadas pelas próprias torres e a utilização de vidros espelhados, com o consequente potencial de criação de ilhas de calor. Não há menção à proibição do uso de vidros espelhados e os diferentes projetos anexados deram a entender que, ao menos em parte das torres comerciais, seriam utilizados”.
Entende “que não é o momento de aprovar o projeto, dessa forma — tem que ter mais estudos“, concluiu Jussara.
Segundo voto-vista — O conselheiro Felisberto Seabra Luisi, advogado, que representa os moradores da região central da cidade, endossou o parecer da colega Jussara, e ainda observou que o processo estaria infringindo a Constituição Federal, Estatuto da Cidade, a Lei Orgânica do Município e a lei do Plano Diretor, “pois não realiza audiência pública para ouvir a sociedade e a comunidade do entorno do projeto, ou seja a população do Menino Deus, do bairro Praia de Belas e os órgãos públicos federais e estaduais como o Tribunal de Justiça e a Justiça do Trabalho que foram inundados pela enchente em maio”. Considera necessária esta escuta para legitimar este projeto e dar o mínimo de legalidade.
Entre outras observações do Felisberto: “Também considera que há um forte impacto em relação à mobilidade urbana e humana porque as pessoas vão transitar em direção ao Parque Marinha e imagine-se o volume de movimento de carros e ônibus que vai se ter essa via com esse empreendimento. Em dias de jogos no Beira-rio a Borges de Medeiros fica engarrafada. Também há a circunstância dos jogos no Beira-Rio que já provoca o fechamento da Borges de Medeiros, tornando-a intransitável. E considera necessário estudos mais aprofundados. Entende também que a infraestrutura do bairro poderá ser afetada. Houve a enchente e tudo foi alagado. Haveria a necessidade de uma bacia de retenção e qual seria o tamanho dessa bacia? A altura das cinco torres de edifícios também descaracteriza a paisagem urbana. Ninguém é contra o progresso, mas a que preço o progresso? Depois não adianta mitigar porque não vai resolver o dano ocasionado. Não existe prédio com a volumetria similar ao do projeto na região.“
Observou também que faltam estudos em relação à mobilidade urbana, em especial às consequências para as linhas de transporte de ônibus.
O Conselheiro é contrário ao parecer da relatora. “Não há porque fazer edifícios desta altura” e deve ser considerado o que pensa a população por meio de audiência pública que deve preceder a análise pelo CMDUA“.
Presidente opõe-se a quem se opõe — O presidente dos trabalhos, Germano Bremm, que é advogado licenciado, embora não vote, representa o Município e o Município tem muitos votos colegiado — ver composiçao atual — e é quem define a pauta e quem pode ou não pode falar seguindo um regimento interno alterado por proposta dele mesmo anos atrás. Embora ninguém pergunte, o secretário e presidente dos trabalhos tem o costume de se contrapor à visão do Conselheiro que se manifeste contra políticas e atos do Governo Municipal. Na reunião desta quarta-feira, fez o seguinte discurso de 4 minutos contrária à realização de audiências públicas, considerando que debater via mídia impressa ou televisiva ou pelas redes sociais supre o debate público: “(…) é importante a gente esclarecer que este Conselho tem a representação da sociedade civil, tem conselheiros eleitos, a região de planejamento lá elege a sua representação para ser a sua voz, o seu posicionamento. Como em toda democracia, às vezes, nem sempre a sua voz vai ser a voz que vai prevalecer. A gente vive numa democracia representativa, a gente elege os vereadores, a gente elege o prefeito para tomarem as decisões com relação ao rumo do crescimento da cidade. Então, especificamente nesse ponto, é importante a gente lembrar, eu relembrei na reunião passada já, esse debate, com relação à edificação proposta, ele estava nos jornais, nos veículos de divulgação, antes da eleição de outubro. Amplamente discutido nos debates públicos sobre ter prédios mais altos ou não em determinadas regiões da cidade. E a proposta, vamos dizer assim, vencedora do pleito, por ampla maioria, em todas as zonas eleitorais, do prefeito Sebastião Mello, que defendeu com diversas oportunidades este modelo de projeto. Não há nada de anormal dentro do plano diretor. O Plano Diretor prevê, desde 1999, esse instrumento de autorização de altura, uma vez debatido nas instâncias, democraticamente regulamentadas, neste caso, o Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano e Ambiental, que tem como, não só as representantes das regiões, mas as entidades, da sociedade civil, da administração pública, enfim, essa dissonância que forma, então, essa concordância da maioria naquilo de interesse para a cidade. Então, é bastante comum, natural, senão não tinha também razão de ser, de a gente ter este debate público, poderíamos só ter a disposição pura e simples da lei, mas aí nós não estamos falando de urbanismo, estamos falando de códigos, a matéria do urbanismo é mais complexa, a gente não consegue regular absolutamente tudo. Não teria, então, a figura do conselho, debate, relatoria, se a gente não tivesse esse instrumento de uma análise mais precisa de alguns projetos que saem fora do padrão, daquele rito tradicional. A gente não consegue prever na lei todas as situações. Então, eu queria só fazer este esclarecimento e convidar a todos novamente para ouvir, assistir a apresentação, onde a nossa equipe do planejamento vai fazer os devidos esclarecimentos, enfim, orientar com relação aos estudos, sombra, o perfil, a questão do plano diretor para a cidade, para aquela região, como é que ela impacta, ela se relaciona com os skyline. Aquela região, ela foi pensada para a cidade, para esse tipo de edificações e cores, para essas áreas, com diferentes alturas. Nós estamos falando de vias extremamente movimentadas da cidade, então, conexões aí que, do ponto de vista urbanístico, a gente já defende há bastante tempo como o espaço ideal para propostas mais arrojadas, com alturas mais significativas, e não é à toa que todos os demais prédios ali do entorno ultrapassam os limites, padrões, do plano diretor, a gente tem o Foro Central, tem o Trend, tem os hotéis, né, há bastante tempo, então, é nesse sentido o objeto da nossa análise.“.
Outras participações: Também participaram da reunião, na etapa inicial, moradores da comunidade do entorno do projeto. Tiago Ruschel Soares se disse arrependido de ter ir contra o projeto do Pontal e agora pode levar crianças para o parque que foi montado e aberto à populaçao. É a favor de haver mais projetos que coloquem a região no mapa, que traga turistas. Vinicus Castel é frequentador do Grêmio Gaúcho e entende que o projeto vai valorizar a região e o parque Marinha do Brasil. Carmem Bagatini afirmou que não questiona o projeto do Zaffari, mas as alturas dos prédios. Porque arranha-céu ao lado da Praça Itália, perguntou. Diz que saiu de barco durante a enchente de maio e o solo continua úmido e ‘vamos ficar sem sol — é capaz de ter apenas uma hora de sol‘. Observou também que não está sendo dito aonde será o terminal dos ônibus da Carris. ‘Quero que o empreendimento venha, mas questiono é a altura dos prédios’. Cristiane Machado diz que as flexibilizações estão previstas no Plano Diretor e que o seu parecer é favorável. ‘Confio muito na capacidade dos profissionais técnicos tanto de quem está propondo como quem está analisando’. O empreendimento deste porte vai trazer empregos e turismo. Vinicius Ávila Pimentel é morador do bairro. “Ninguém é contra o investimento. O problema são os impactos. Fica muito dificil ser a favor de um projeto sem escutar os moradores. O melhor seria realizar uma audiencia pública para ouvir a população. A questão é quem está ditando os rumos do impacto urbano hoje em dia? Como é que não está sendo feita nenhuma consulta aos moradores do entorno? Consultem a associaçao dos moradores do Menino Deus!”
Ministério Público – A ACOMAPA – Associação Comunitária de Moradores e Amigos de Porto Alegre representou ao Ministério Público do Estado nesta quarta-feira, antes da sessão, solicitando o exame da legalidade do projeto à luz do Plano Diretor e da legislação ambiental e urbanística vigente. Pede também a avaliação detalhada dos impactos ambientais, urbanos e sociais do projeto, incluindo o impacto na drenagem, no tráfego e nas condições de saúde e bem-estar dos moradores da região. Veja a íntegra. O expediente foi encaminhado à secretaria da Promotoria de Justiça de Defesa do Meio Ambiente de Porto Alegre.
Votação – A votação em si do projeto está prevista para a próxima reuniao do CMDUA. Até iniciar o regime de votação, cada membro que porventura já tenha divulgado o conteúdo de um voto, poderá reve-lo.
Leia também:
— Estatuto da Cidade – regulamentação
— Assista a íntegra da reunião do CMDUA desta quarta, 5/11
Redação do Jornalista João Batista Santafé Aguiar Assine o Canal do AgirAzul.com no WhatsApp – todas as notas publicadas aqui e algumas mais no seu celular. Link para contatos e envio de materiais para o AgirAzul. Ilustrações e arte da apresentação realizada pela Prefeitura Municipal do projeto do empreendedor.