Os conselheiros que deveriam representar as entidades não-governamentais no Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano e Ambiental poderão ter um curto mandato. Por inúmeras trapalhadas jurídicas cometidas pela Comissão Eleitoral designada pelo Município de Porto Alegre para realizar as eleições dos conselheiros, cinco entidades propuseram na justiça a anulação do processo eleitoral e posse de representantes de entidades da sociedade.
Por decisão judicial desta quarta-feira (27/3/2024), o Município de Porto Alegre terá 30 dias para apresentar à Justiça os documentos de inscrição apresentados por entidades de classe na eleição e disponibilizar a íntegra das decisões lançadas nas impugnações apresentadas para as inscrições.
A ação anulatória de atos administrativos foi proposta pela SOCECON – Sociedade de Economia do Rio Grande do Sul, ASTEC – Associação dos Técnicos de Nível Superior do Município de Porto Alegre, IAB – Instituto dos Arquitetos do Brasil / Dep. Rio Grande do Sul, IBDU – Instituto Brasileiro de Direito Urbanístico e ACESSO – Cidadania e Direitos Humanos contra atos do Município de Porto Alegre. O objetivo da ação é anular as eleições das entidades de classe consideradas eleitas para a composição do Conselho.
O CMDUA é composto por 28 conselheiros sob a presidência de um secretário do Governo, mais 9 representantes governamentais (7 municipais, 1 estadual e 1 federal); 9 representantes de entidades não-governamentais, constituídas: por cinco entidades de classe e afins ao planejamento urbano — duas entidades empresariais, preferencialmente da área da construção civil, e duas entidades ambientalistas e instituições científicas; e 9 representantes da comunidade (8 das regiões de planejamento da cidade e 1 do orçamento participativo)
O pedido liminar de suspensão da posse da nova composição do Conselho foi indeferido neste momento — disse o Juiz de Direito Gustavo Borsa Antonello, da 4a. Vara da Fazenda Pública de Porto Alegre, que aguarda “com expectativa a integral publicidade da documentação em cumprimento ao edital”. Entendeu o juiz que impedir de plano a posse dos eleitos “atenta contra o resultado das eleições que expressam a vontade da maioria dos eleitores”. Os autores irão recorrer deste ponto ao Tribunal de Justiça.
Pedidos dos autores
As entidades autoras trouxeram a redação do art. 40 da Lei Complementar nº 434/1999 que afirma: — O CMDUA compõem-se de 28 (vinte e oito) membros titulares e seus suplentes, designados pelo Prefeito, com renovação bienal e a seguinte composição: P…] II – 9 (nove) representantes de entidades não-governamentais, constituídas por entidades de classe e afins ao planejamento urbano […].
Pelo edital que regulamentou as eleições, afirmam os autores, tanto as entidades de classe quanto as entidades afins ao planejamento urbano poderiam ter representantes, enquanto somente as entidades de classe que sejam afins ao planejamento urbano poderiam integrar o colegiado.
Também defendem que o edital previu a participação de entidades da administração pública direta ou indireta para comporem o fórum das entidades ambientais e instituições científicas, enquanto a lei assegura a participação exclusiva de entidades não governamentais.
Os autores demonstraram que as impugnações relativas às inscrições apresentadas “embora recebidas não foram devidamente publicadas no site oficial” e nem foram publicizados os documentos de inscrições das entidades “para o fim de verificar o enquadramento das mesmas e para poder apresentar as devidas impugnações”. Argumentam que sem a devida publicidade, impossível exercer o contraditório, a ampla defesa, e que teriam sido irregulares a homologação das inscrições, impugnações e votação.
Entendem que não poderiam ser empossados os conselheiros representantes de entidades eleitos nas regras do Edital nº 6/2023 (link) .
Entendimento do Juiz
Entende o magistrado Gustavo que “tanto os representantes das entidades de classe, quanto outras entidades (que não sejam de classe) devem ter afinidade com o planejamento urbano, temas aliás que se constitui em uma das pautas fundamentais do Conselho, cuja finalidade é ‘formular políticas, planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano’ (caput, do art. 29, da Lei Complementar Municipal 434/99)”. Concluiu que, “em princípio, há ilegalidade no edital e, por efeito, na participação e eventual eleição de entidades de classe, de natureza necessariamente profissional, que nada tenham a ver com planejamento urbano”.
Na categoria foram eleitos a Câmara de Dirigentes Lojistas de Porto Alegre, o Conselho Regional dos Corretores de Imóveis da 3a. Região, a Ordem dos Advogados do Brasil/RS, o Sindicato dos Trabalhadores da Indústria da Construção Civil de Porto Alegre e a Sociedade de Engenharia do Rio Grande do Sul.
Continua o magistrado: “Se dentre essas 5 entidades eleitas, há ou não entidades de classe classificadas pela Comissão Eleitoral como ‘necessariamente profissionais’, não se sabe, já que a mesma Comissão, aparentemente, ocultou dos participantes das eleições essa fundamental informação”.
O Município alegou administrativamente proteção dos dados pessoais para indeferir solicitação de publicizaçao dos documentos de inscrição e impugnação.
Entende o magistrado que “a ineficiente organização do certame, em clara afronta à publicidade dos atos administrativos, atenta contra transparência, já que é direito dos participantes não só terem acesso aos documentos apresentados pela entidades escritas, quanto ter ciência dos fundamentos das decisões sobre as impugnações apresentadas”. “É preciso deixar claro que a Lei Geral de Proteção de Dados (Lei nº 13.709/2018) tem o objetivo de ‘proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural. Não é e nunca foi a Lei Geral de Proteção de Dados escudo a servir de blindagem para ocultação e despiste sobre informações relevantes, sobretudo quando se trata da Administração Pública. O acesso aos documentos apresentados pelas entidades concorrentes em nada ofende ou viola ‘dados pessoais’ protegidos pela lei em questão e não se traduz em exceção oponível à publicidade”.
Embora o Juiz entenda que teria havido irregularidades, recorda que “os atos administrativos gozam de presunção de legitimidade, o que lhes confere a regularidade do exercício da função estatal’. Observou que ‘essa presunção não é absoluta e admite prova em contrário, o que tiveram a oportunidade de produzir os autores em sede judicial”.
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Redação do jornalista João Batista Santafé Aguiar para o AgirAzul.com. Indicação de formas de contato com a redação neste link. Associe-se ao Canal do AgirAzul.com no
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