Artigo: Tempo – é o que falta

27DA83E1-1359-4321-8BF9-A9145C51B0B4.jpegPor João Batista Santafé Aguiar

Mesmo vivendo tempos de profunda radicalização, surpreende a todos a defesa acirrada pelo atual governador do Estado da pressa em ver aprovado um novo Código do Meio Ambiente do Estado do RS. Provavelmente, houve avaliação no Palácio Piratini, de que, a exemplo de outras votações na Assembleia acontecidas neste ano – como a da privatização da CEEE e outras empresas – havendo a maioria necessária, isso bastaria para ver as 480 modificações na lei atual serem aprovadas rapidamente.

Mas surgiu uma profunda irresignação da sociedade na tramitação urgente da matéria, inclusive de ex-secretários do Meio Ambiente dos mais diversos espectros políticos. O próprio Ministério Público, com a estrutura que tem, após uma semana de trabalho de um grupo especialmente designado, divulgou mais de 60 proposições, mas anotando que, antes de tudo, poderia contribuir mais e que seria essencial a abertura do debate para com a população.

Não há urgência de fato na tramitação da matéria: não há razão econômica, não há razão climatológica ou qualquer outra – apenas a oportunidade de aprovação imediata pela maioria parlamentar que o governador conseguiu formar para quaisquer assuntos que submeta.

Mas mesmo que a decisão do desembargador Francisco José Moesch, do TJRS suspendendo a pressa na tramitação, seja revertida, fica o que já foi dito pelo próprio em sua decisão: “O desenvolvimento sustentável só poderá acontecer se houver a participação de todos os cidadãos, estabelecendo a essencial conexão entre a sociedade e as autoridades, como demanda um contexto democrático”.

Urge que o próprio Eduardo Leite retire o pedido de urgência e seu time dos tribunais. As articulações para grandes modificações no Código surgiram em 2016 mas nada foi protocolizado, sendo impossível a manifestação plural da sociedade. Houvesse menos resistência ao debate público da matéria pelos governos, o passado e o de agora, a legislação atual, de 2000, já teria sido aperfeiçoada.

Agora, as 28 emendas oferecidas, algumas por deputados da própria base do governo – o que denota por si a falta de discussão mesmo nas áreas internas, além daquelas sugestões do MP e as com outras origens que teriam que ser consideradas para legitimação do resultado – cria a tarefa impossível de redigir-se uma síntese aproveitável em apertado prazo.

Sem considerar que diversas estruturas organizadas da sociedade, como as apartidárias ONGs ambientalistas, por falta de condições mesmo de estudar de inopino as proposições, tivessem tido condições de poder manifestar-se sobre a totalidade das modificações.

Espera-se que Eduardo Leite, o jovem bacharel em Direito formado na vetusta Faculdade de Direito da Universidade Federal Pelotas criada em 1912, a segunda mais antiga do Estado, atual governador do Estado, e que esteve junto a Bernardo de Souza no último governo deste no Município como secretário da Cidadania, honre a memória do inovador prefeito, criador do Orçamento Participativo.

Leite pode dar um passo à frente e reconhecer a necessidade de maior discussão, colaborando com a qualidade dos resultados do trabalho da Legislativo. Mesmo não tendo sido observado na totalidade, o atual texto do Código do Meio Ambiente do Estado (Lei nº 11.520, de agosto de 2000), tem uma característica — todos concordam neste ponto: pode ser sim aperfeiçoado.

O Correio do Povo deste sábado, 2/11, coluna da sempre bem informada jornalista Taline Oppitz, traz informações sobre outras formas de o Governo do Estado conseguir viabilizar a aprovação do Código, ou seja lá como chame, até o final do ano. Todas são idéias estapafúrdias. Que o Governo renda-se ao evidente – precisamos de mais tempo. Tempo para discussão. O Governo foi eleito pelo povo e guarda legitimidade para agir, mas não atropelando o devido processo legislativo, no caso.

É necessário tempo. Tempo.

* O autor é Jornalista – editor do site AgirAzul.com

 

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